sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Pleonasmo

Meu antivírus tem a real segurança pra me oferecer, a melhor e mais confiável. Alguma página engraçada do Facebook me faz ter segundos de risada descontraída, quase um minuto mesmo às vezes. Eu me divirto cegamente durante mínimos momentos com piadas tão bobas e boas. Algum tumblr legal que eu sigo e continuo seguindo. Twitto uma novidade inteligente sobre a vida da minha banda preferida. O último vídeo que eu subi pro Youtube é do meu gato, meu companheiro. Uma cerveja boa de beber na foto do Instagram e bem ao lado da mesa que está a cerveja: o meu computador. Desligo a máquina e vou dormir. Pleonasmo. Eu já dormi o dia todo.

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Crisântemos

A minha boca tá seca e quebrada. Não, não é por causa do frio nevado e longo que faz nessa vidade. É porque tua saliva não me lambe mais. Meus seios estão murchos. Não, não é porque eu tô velha. E muito menos porque eu alimentei muitos filhos. Eu nunca tive alguém sangrando de mim além de mim mesma. É que tuas mãos estão ausentes e indizentes. Meus olhos quase não piscam porque dói fechá-los abri-los e ver que você ainda não está outra vez. E nem nunca mais. Nunca menos. Nunca menos difícil que agora sendo. A minha parte molhada não é minha coxa lambuzada ela é de lágrima salgada. Arde quando sai da boceta. Não, eu não quero rascunhos. E nem me importo se sair torto ou borrado. Eu quereria se pudesse e quero mesmo não poderia. Mas é que a terra vira lama quando molha ou umedece e fede embaixo da grama.

sábado, 8 de setembro de 2012

Feriado

Sapatilha roxa no canto da praça no meio das avenidas. Sapatilha roxa no canto da praça no meio das avenidas com furinhos iguais. Um maior bem na onda que o pé faz. Onda que o pé faz veia verde que sai do pé unha ruidosa de asfalto que o dedinho do pé tem, rugas retilíneas que o dobrado pé deixa escapar. O creme branco fica preso nas rugas retilíneas e lembra que as vezes esquecemos de terminar o começado. 

Sapatilha roxa no canto da praça no meio das avenidas com furinhos iguais esquecida obrigatoriamente. Saiu de casa brigada com o tênis esportivo preto. Mas os quatro pés se confundiram nos lençóis brancos de rosas rosas algumas horas antes. Se entrecruzaram e se perderam em meio a tanta pele pelada e misturada. A cor vermelha da boca da sapatilha roxa está na cara nos ombros na nuca no pescoço do tênis esportivo preto. 

Começaram em pé, na porta do quarto. Não não. Começaram naquele outro outono dia no fim da festa ela sozinha sem jeito ele sozinho carente. Ela carente também. Mas o batom vermelho fingia que não. Palavras trocadas, memórias trocadas, confidências confessadas. Palavras trocadas, memórias trocadas, excreções trocadas, suores trocados, gozos compartilhados rumores de prazer pelas paredes dos cantos da casa da mesma praça do corredor do elevador do interlocutor. Interlocutoriando pelo interfone. Inteiros quase internos pelo hall de entrada. E querendo entrar entraram então. Casa. Porta. Cozinha. Sala. Corredor. Quarto. Quarto. Quarto. Começaram em pé, na porta do quarto. Sapatilha roxa querendo dominar, mas o tênis esportivo preto é mais forte. E segura os braços da sapatilha roxa que se derrete e se deixa dominada. Língua na língua tua. Língua no lábio teu, no rosto teu, na orelha tua, cara tua, nuca tua, pescoço teu. Tão meu. Tão... língua nas costas, ela de costas, língua nas exuberâncias redondas abaixo das costas molhadas; clitóris molhados. lambendo a língua que lambe também. Mãos nos seios atentos. Mãos arredondando nos seios arredondados. Mãos espertas nas firmes gotas dele decididas. Mordidas. Dela pelas costelas. Mordidas dela pelas costelas dele, braços dele; orelhas; nuca; peito; pescoço, dedos dele. Na boca. Dela. Na intimidade. Dela. Ela. Mela. Ele. Rela. Línguas toques truques dedos olhos furtos mãos marés pernas coxas, pés confundidos em meio à confidências confessadas nos lençóis brancos de rosas rosas. 

Confidências confessadas. Compartilhadas. Confidenciais contrariadas. Contradizendo. Contracompreendendo. Por confidências exageradas. Língua na língua rua. Corredor. Sala. Cozinha. Porta. Rua. Mãos nos braços que desviam. Pés desencontrados. Um par a chegar no outro que foge, que se fode. Dedos no gatilho que aperta. Nem costas, nem orelhas, nem nuca, nem pescoço. Sem afago ou remorso bem na onda que o pé faz. Nem creme de morango deixaria essa bala doce. Bala cinza que ficou sangue. Quente e ardente ardendo o buraco da pele pelo qual passa. Nervos moles a tropeçar a sapatilha roxa no canto da praça no meio das avenidas com furinhos iguais um bem maior na onda do pé esquecida obrigatoriamente. Quase combinava com o resto das flores que queriam adentrar o verão.

terça-feira, 4 de setembro de 2012

Fino Cilíndrico

- Essa é a única fumaça com a qual eu me adaptei.
- Oi? 
- A fumaça. Do cigarro. É a única com a qual eu me adaptei. 
Ele já tinha tentado várias. 
- Eu já tentei várias. 
Os dois estudando, as paredes marrons da sala pequena ficaram esbranquiçadas. Ele já um pouco cansado reparou nos desenhos que o cigarro fazia no ar. Ela levantou a cabeça do caderno pra ouvir o que ele dizia. Concentrada estava, mas nem tanto. Talvez porque ler e segurar o espesso fio com cor de céu triste entre dois dedos enquanto o leva à boca desconcentre a leitura. Talvez porque os cálculos estavam entediantes. Ela o olhava afirmativamente com a cabeça sem compreender muito bem, mas querendo participar do assunto enquanto a fumaça entrava nos pulmões. 
- E as outras? 
- As outras fumaças não me apetecem. 
- Elas não soam flutuantes? 
- Não é só isso. A do charuto é muito densa, a da maconha fede demais, a do cachimbo é muito escura e a do incenso muito cheirosa. 
Ele explicou que não, nunca tinha fumado um incenso. Ela então falou que quando criança agarrava às escondidas as bitucas que seu avô jogava no jardim. As guardava num pequeno pote redondo de lata onde antes tinham balas coloridas de morder. Era o seu segredo, ela dizia. 
- Era o meu segredo. Me enfiava atrás da casa, no corredor esquecido que ficava ao lado de fora pra cheirar os pequenos cigarros quase mortos. Comigo eles nunca morriam. 
E falaram tanto até que a sala ficasse ainda mais pequena, até que a cor da parede tomasse cor fumaça e os livros chatos de números em cima de frações ao lado de vírgulas se perdessem no teto de letras que voam.