sábado, 8 de novembro de 2014

Na porta da geladeira

- tomate
- cebola
- banana
- macarrão
- gengibre
- arroz
- imprimir zine
- lentilha
- queijo
- depilar a perna
- ligar pra Elisa
- enviar projeto até 07/04
- farinha
- linhaça
- vinho
- cerveja
- menstruar
- encontrar um amor
- relatório CPA
- passagens SP
- absorventes
- sabonete
- detergente
- sabão em pó
- $ aluguel

segunda-feira, 27 de outubro de 2014

Pode-se não falar com o vigilante

Foto: Paula Arenhart


Vai pelas ruas observando cada milímetro. Um espirro segurado, uma pessoa tentando encontrar a porta certa no banco, um que foge do outro, a sandália que rasgou, o tropeço, a lambida no sorvete, o pombo comendo pedra, a tatuagem errada, as havaianas, o carinho nos olhares, a que passeia sorrindo sozinha, o grito escandaloso da criança, o desempregado que conta moedas, um homem que segura o choro sentado sozinho, um homem excitado sentado sozinho, um homem sentado sozinho.

Placas coordenam a valsa descompassada: não entre na loja com sorvete, vire à esquerda, atravesse a rua em 27 segundos, exclusivo motos, exclusivo ônibus, óculos importados exclusivos, praça zacarias, cuidado cliente quebrou pagou, não pise na grama, 70% de desconto, para ser atendido aperte a campainha, diga não às drogas, você tem um minuto?, devolvo amor em uma semana, você conhece a deus-mãe?, aqui dentistas, pode-se não falar com o vigilante.

O cara que sempre toca violino ali, o casal que sempre canta com a sanfona, o fôlego, o oil man, a chuva, os doces na vitrine, a fila pro elevador, o anúncio aluga-se, o atrasado, o apressado, o desavisado, a morte da bezerra, a cerveja gelada escorrendo por dentro da garganta, a fila da padaria, o cafezinho fora de hora, o cachorro passeando com seu dono, os cabelos coloridos, a propaganda, o protetor vencido, os paralelepípedos, a tosse da vaca.

Seu cheiro, uma lembrança, olhos na nuca, um susto, você, a esquina, atravesso. Não olhe para a direita.

Um momento único, porém rodiado, a respiração perceptível, o ontem intervindo no hoje e focado no amanhã. É o hoje mesmo? Sei-lá! É o azar vitorioso, a divisão por zero que soma, o sem nexo com relevância, dependendo onde estar. Não é nem mais e nem a menos, é apenas o tempo, a mesma oportunidade fundante para diversas interpretações alienada ao mais alimentado. A ventoinha girando, o silêncio limpando, o passarinho cantando e o tempo passando - o meu e o seu.

Sorria, você está sendo filmado.

O cheiro da pipoqueira, os incontáveis chicletes grudados no asfalto, sacos transbordando lixo,o amontoado fora da faixa.

sexta-feira, 17 de outubro de 2014

Castanha-chuva

Enquanto o dia escurece antes que seja chegada a hora da lua estar visível aos olhos, e no mesmo momento em que o vento atravessa até a mínima fresta da janela da sala, Catarina morde uma castanha podre. De tamanho pequeno, mas suficientemente grande para uma-do-pará ela demora certo tempo em perceber o sabor morto. Não por ter o paladar desatento, mas pelas calmas mordidas que conseguiram triturar primeiramente a metade não estragada da castanha. 

Assim que os dentes romperam as fibras do pedaço desagradável, sua língua molhada quis devolver imediatamente aquele petisco potencialmente ofensivo. Os lábios, ao contrário, mantiveram-se cerrados como se cola persistente os pregasse. Ao perceber a rigidez de seu beiço ela levou as mãos à boca de forma a fazer movimentos verticalmente contrários, a fim de desencravar as peles grudadas uma a outra.

Após repetidas tentativas frustradas e emissão de sons angustiados, aqueles possíveis com a boca fechada, Catarina desesperou-se. Apesar da vontade de vomitar, seus lábios mantinham-se firmes na decisão de fecharem-se para o mundo. Questionando se haveria naquele pedaço podre de castanha qualquer espécie de substância capaz de imobilizar partes de seu corpo, Catarina sente a massa triturada e fedorenta crescer em sua boca. Ela tem medo de engolir aquela gosma. Ora, se a castanha conseguiu petrificar meus lábios o mesmo fará com meu trato digestivo. Minto, ela não pensou em termos técnicos ou formais. Caralho, se essa porra de castanha travou meu beiço vai foder comigo por dentro! A-do-pará se mesclava cada vez mais à saliva acumulada e Catarina se incomodava com essa espécie de bolo cru fermentando dentro dela, tornando-se pasta mole e marrom.

Quando tudo tentou e nada mais pôde fazer, Catarina se entregou ao sabor amargo e com nojo engoliu o volume pastoso. De olhos fechados sentiu o suco mal cheiroso de castanha-do-pará-podre descer até cair como cimento em seu estômago. Tal pancada a derrubou no chão. Ela não conseguiu levantar tamanho peso fétido mesclado ao suco gástrico. Aflita, ela deitou no piso frio e chorou. As lágrimas caiam silenciosamente enquanto seu rosto gritava de dor. De algum modo, o veneno em seu estômago espalhou-se rapidamente por outros caminhos internos e rim, pâncreas, bexiga, fígado, intestino. Catarina nunca havia sentido de maneira tão precisa seus órgãos. O medo a fez contrair todos e cada músculo, o que potencializou a aguda dor que sentia. Com um grito raivoso ela se entregou ao que não queria e, relutante, relaxou todo o seu corpo, cabeça, pescoço, pernas, orelhas, braços, baço, dedos, sobrancelhas, joelhos, língua, artérias, veias, células, sangue, pele e pêlos.

A dor era medo. Atenua, Catarina, atenua.

Catarina desacelerada derreteu. Escorreu pelas mínimas fissuras do chão branco e ficou derretida por algumas horas. Deu o suspiro mais profundo de sua vida e levantou-se. Queria comer as pitangas do pé de árvore da esquina.

domingo, 3 de agosto de 2014

Frete

Louças na pia: Noite atípica de inverno. Em meio à estação mais gelada do ano, o vento que fez cócegas em nosso rosto era morno. O céu parecia de verão: forte azul e nuvens claras. No jardim de casa as garrafas vazias e os pratos sujos da noite anterior. E sinto o cheiro do seu tempero.

Mais sentimental: Hoje é domingo e se este dia da semana possui em sua presença uma sensação de fim e recomeço, nesta noite ela se tornou mais forte. Eu sei que você ainda continua na mesma cidade, em bairro não distante. Acontece que te ajudar com as roupas e os livros, os mesmos que pintaram o quadro da nossa história, fez esse domingo parecer mais estranho que os outros.

Doses exageradas: Aquela xícara que eu gostava, branca e preta, a pequena que me servia na medida exata de meu gosto. Pode levar. Leva porque eu me lembro você esperando eu terminar meu café pra beber o seu. Naquela xícara. Você esperava com estilo, o sol da manhã iluminando a primeira leitura do dia. O pijama ainda vestido. Leva essa xícara porque a partir de hoje só beberei doses descompensadas. Não preciso de medida exata pro meu gosto passado.

Esse quarto: Você esqueceu seu perfume na estante perto da cama. Esqueceu ou deixou? Será que esqueceu pra que eu te faça uma visita em sua nova vista bonita, ou esqueceu porque quer mesmo deixar tudo pra trás? Você esqueceu pra que eu sempre me lembre de você, pode dizer. Você sabe que vou demorar meses até colocar o frasco no lixo. Dos lençóis ao odor que escapa da tampa que não fecha. Era eu que deveria ter deixado essa casa.

quarta-feira, 4 de junho de 2014

Pessoa Oculta

Mais uma Segunda-Feira.
Mais ou menos no mesmo horário passo em frente àquele café de esquina.
Mais uma vez te vejo sentado na mesma mesa.
Mais um café, ao que parece do mesmo café, você toma. Seus cabelos encaracolados ocupam o mesmo lugar de sempre. Cadeira que dá vista pra rua. Em que será que você repara quando seus olhos atrás das lentes se cansam da luz do computador? O que será que você pensa quando para de ler esse trabalho aí? Que tipo de coisa desprende a atenção de seus dedos, digitadores frenéticos? Será que você já percebeu que toda Segunda-Feira no meio da tarde eu passo em frente ao seu lugar reservado? Eu percebi que não tem sido coincidência te ver sempre no mesmo café, na mesma cadeira, no mesmo dia da semana, na mesma hora.
Ops, alguma coisa de você eu descobri. Alguma coisa além dos cachinhos simpáticos do seu cabelo, alguma coisa além de “antes você não usava óculos”, alguma coisa além do oi inesperado nos corredores de toda semana. E você? Será que você já percebeu que toda Segunda-Feira no meio da tarde eu passo em frente ao seu lugar reservado? O que será que você descobriu de mim? Reparou que cortei os cabelos? Reparou que antes de ter mais uma vez a nuca de fora meus fios ficaram longos e até coloridos? Viu que sumi por uns meses?

Como será que é a sua Segunda-Feira? Onde será que você estava antes do café? Pra onde você vai depois? Sempre te vejo com a mesma xícara. Passo rápido, eu sei, mas é sempre a mesma xícara porque é sempre do mesmo tamanho. Você só bebe, não come? Bebe a mesma bebida? A bebida de sempre? Qualquer dia diminuo os passos e como uma torta alemã, você vai ver.

Viu? Entrei no café. Eu vi que você viu. Vi que mexeu nos cachinhos, como se tivessem caído em seus olhos, só pra vira a cabeça pro meu lado. O horário me ajuda a escolher uma mesa estrategicamente posicionada para que eu te veja por cima do conto que estou lendo. Estou realmente interessada na leitura e minha timidez deve ter te confundido. Afinal, entrei nos seus olhos quando cheguei (tanto que senti uma coisa quente em mim, confesso) e agora fico com cara escondida atrás dessas páginas. Nada que o café com leite não possa me ajudar. Você viu que eu nem tô mais com a cara escondida atrás das palavras tagarelas que leio? Viu? Notou que mudei de posição quando uma moça sentou no meio da gente? Percebeu que pedi o tamanho grande, e não o médio, só pra demorar mais em ficar aqui nesse café de esquina, brincando de olhar meu olhar no seu?

O homem do conto está trepando com a mulher do conto. Foi logo depois do primeiro beijo, um beijo meio sem jeito com carinho nas orelhas. Será que o homem do conto tem cachinhos que nem você? Será que a mulher do conto é romântica como eu? Como será que é o seu corpo? A textura, a temperatura. O toque. E a voz? Oras, foi um oi muito rápido e há muito tempo. Sabia que me lembro do seu risinho em canto de boca naquele dia? Sabia que fiquei morrendo de vergonha e nem sei se minha voz soltou o oi pra te responder?

Como será que é tirar sua roupa? Que gosto tem sua língua? Que cor tem sua pele quando fica arrepiada? Será que suas mãos são quentes? Que cheiro você tem? Será que seus lábios são bons de morder? É que eles parecem bons de morder. Mostra mais seu sorriso, ele é tão bonito.

Ela chegou e te deu um beijo. Será que alguém reparou na minha cara de decepção? Será que você notou eu tentando disfarçar?
Vocês pagam a conta depois que ela come. Ela eu sei que come.
Nem quero mais saber aonde você vai depois do café.
Mas hoje eu não comi torta alemã.

Viu, qualquer dia diminuo os passos, viu? E como uma torta alemã, você vai ver.

quarta-feira, 28 de maio de 2014

3:07

O frio e a chuva colocaram a cidade para dormir. Lá fora, os carros esquecidos ao lado da calçada denunciam a falta de coragem dos moradores em gelar o nariz e as orelhas. Ao pé da lareira ela termina de ler o romance que a fez suspirar levemente os lábios, que a lembrou do belo sorriso da noite passada. Antes de dormir olha pela janela a calma do bairro, o silêncio do inverno. Aproveita essa estação para fingir ter voltado ao tempo da não luz elétrica e sobe com uma vela até o seu quarto. Cansada, cai no sono antes que a fumaça da chama apagada se afastasse da cama. Dorme um sono de pedra, nem ao menos se move. A intensidade das atividades da semana é tão presente enquanto descansa que sente sobre seu corpo um peso vivo, atento. Ao tentar se livrar dele percebe que sua imobilidade não se deve ao cansaço. Abre os olhos, preocupada. Um susto. Uma pessoa. Ao tentar entender o que acontece consegue virar a cabeça para o lado, apenas porque foi deixada. São 3:07. Em cima de seu pijama alguém prendeu seus braços e pernas em cordas de nós precisos. O olhar que a seca é ameaçador, confiante, sem remorso. Aquele olhar sorria o sangue que logo iria escorrer. Sem pressa e preocupação, como quem espera a água ferver em fogo baixo, a mão alheia lhe tampava a boca com prazer em sua expressão facial. Ao erguer a mão que segura a faca afiada, a pessoa que planejara por semanas o assassinato quase goza antecipadamente.

Um susto.

Um sonho.

Ufa. Ela abre os olhos. São 3:05, a porta range.

domingo, 25 de maio de 2014

Lenços de Papel


Levanto apenas um pouco mais cedo do que desejava. Precisava das cópias de uns capítulos. Espero a multiplicação dos textos encostando minha fome no balcão de uma padaria, uma das poucas que tem por aqui. Aproveito as padarias aos sábados, já que aos domingos elas adormecem nessa região da cidade. Como gosto de gastar meu tempo nesses lugares, durante a semana frequento os cafés pequenos e aconchegantes, mas que pelo tamanho me expulsam logo. Aliás, quase tudo adormece nesse centro aos domingos. As ruas e portas fechadas dão, então, o espaço merecido aos transeuntes que hoje não correm pelos paralelepípedos sujos e calçadas quebradas.

Descubro o conforto das mesas ao fundo do estabelecimento que visito pela primeira vez. Enquanto aguardo o queijo quente em pão francês temperado com o sabor único dos resquícios de outros sanduíches feitos na mesma chapa, ajeito os óculos que, menos querendo que precisando, voltei a usar. Procuro a página parada do conto que estou lendo. Preparo-me para treler um trecho impressionantemente divertido daquela história. Quando minha mente toma fôlego para, em minha cabeça dar voz às palavras escritas, sou tomada pelo cheiro do café com leite. Quente. Quente como pede essa manhã preguiçosa, quente como deseja quem vive a cidade agora molhada. Quase que para manter uma tradição inconsciente, queimo a ponta da língua na vontade ansiosa de esquentar meu esôfago.

Após a primeira mordida reparo finalmente na televisão. Um clássico duelo do vôlei onde me empolgo na torcida do Brasil contra a Itália. Adoro assistir vôlei. Minha atenção se divide entre o prato, a xícara a tela colorida. Acompanho cada toque, cada saque. Sou a torcedora mais animada dali. E a única. Depois de meio queijo quente no estômago e com o esôfago aquecido, percebo que o jovem senhor que se sentou à mesa um pouco atrás da minha também acompanha a partida. A impressão que tenho é que, ao contrário de mim, ele quer rapidamente o resultado final. Tão rapidamente quanto a velocidade em que engole sua empadinha. Toda a coca subiu pelo canudinho. Pronto, sou outra vez a torcedora solitária.

No intervalo entre um set e outro apanho rapidamente o livro e deleito-me mais uma vez com as mesmas páginas. A cada vez que releio, descubro um novo detalhe. Da mesma forma quando, no outro intervalo entre os sets (sim, o jogo está emocionante, meu caro!) reparo na divertida decoração da padoca. As paredes de amarelo intenso exibem flores de plástico postas em simpáticos vasinhos. Elas, por sua vez, dividem o mesmo espaço com reproduções de flores de Van Gogh. Um desafio interessante aos olhos.

Saio correndo quando Brasil e Itália seguem empatados. Eu mesma insiro o cartão na máquina. Eu mesma escolho a opção débito, digito o valor da conta e recuso minha via. Agilizei-me enquanto as mulheres atrás do balcão discutiam os últimos detalhes de uma festinha surpresa. Desejo um feliz aniversário à funcionária desconhecida, acelero meus passos para pegar o sinal verde e não ter de perder minutos do jogo parada antes da faixa de pedestres. Pego e pago a multiplicação dos textos.

Chegando em casa, peço uma televisão emprestada e sofro no último set. Um ponto para cada time a cada vez que a bola é arremessada, o que aumenta consideravelmente a quantidade de pontos necessários para se vencer. E venceram. Mais uma vez venceram. Agora, um pouco mais calma, devolvo a TV, termino de treler aquele texto e saio em busca de mais uma aventura. Desta vez, carregando lenços de papel.

quarta-feira, 5 de março de 2014

Quarta-feira de cinzas

Parece que escureceu de repente. O céu passou de azul-bebê a azul-bêbado em poucos minutos. A noite torna as luzes dos faróis contrários mais fortes e sinto como se elas invadissem minhas pupilas como feixes pontudos. Agudos.

Pontiagudos.

Mais um motivo para eu gostar do horário de verão e o principal motivo para eu detestar dirigir em rodovias durante a noite. O som calmo escolhido para a viagem, não, ele não me adormece, por ter medo de conduzir o carro em estradas bocejo de cansaço, não de sono, não, ele não me adormece, apenas acalma minha ansiedade em acelerar a velocidade, soltar o freio mão. Os acordes que saem do rádio acompanham a curva do meu pensamento que contornou a faixa amarela contínua e se lembrou de uma história:

- Você apareceu nos sonhos essa noite.
- Ah, é?
- Aham.
- E o que você sonhou?
- Então, foi meio estranho. Eu sentia que nós estávamos próximos, mas eu só te via de costas. Era uma sala de um apartamento calmo iluminada pela luz morna do sol em fim de tarde. Você vestia uma camisa branca maior que seu tamanho. Sentada no chão marrom, de frente para uma janela enorme, seu corpo se aquecia do suco gelado que tomamos. Nós conversamos algumas coisas, demos umas risadas, mas eu só te via de costas. E sonhei que soltava seu cabelo, e ficava trançando-o. Mas nunca conseguia terminar a trança. E sonhei que soltava seu cabelo, e ficava trançando-o. Mas nunca conseguia terminar a trança. E sonhei que soltava seu cabelo, e ficava trançando-o. Mas nunca conseguia terminar a trança.

Mais um pedágio. A iluminação viva que toma conta do telhado extenso alivia o latejar em meus olhos, afinal, aqui a luz não nasce apenas de pontos isolados. Sorrio para o moço que separa as moedas do troco porque gosto de sorrir. Ele é simpático e me responde um boa noite sincero. Sinto falta do seu boa noite aconchegante. Aquele que ainda não conheço, mas que me toca o rosto antes de dormir.

Percebo uma grande movimentação na outra pista. Sirenes mudas e uma leve confusão denunciam um ônibus tombado. Me espanto ao ver tamanho automóvel preso ao chão, mas após engolir o ar rapidamente e olhar para a esquerda não vejo ninguém aflito, ninguém chora. A cena do desastre parece acontecer em câmera lenta. Acho que não passou de um grande susto. Não tenho certeza. Especulo sem sucesso se havia muitos passageiros, se outro veículo se envolveu na colisão, se alguém ficou machucado, se morreu. Esses pensamentos crescem incontrolavelmente na minha cabeça, aquela cena me faz lembrar o quão frágil é a vida. Penso na minha família, que estou longe de todos e que estou sozinha. A saudade aumenta. Quando volto para a Capital, após visitá-los, a saudade aumenta. Durante alguns dias após o fim da visita ela espreme meu coração e faz suco de sangue triste em mim. Eu me desespero e balanço a cabeça repetidas vezes a fim de jogar para fora essa sensação de medo e angústia. Eu choro, mas quase, porque ao receber as lágrimas que quase caem me permito fechar os olhos por breves segundos, sempre longos quando se está na estrada, mesmo que o caminho seja essa reta a atingir o horizonte, mas me permito fechar os olhos. E mesmo assim os feixes pontudos dos faróis me pinicam. Sabe aquela lágrima que escorre sem querer denunciando a dor e percorre a eternidade do rosto até que finalmente se cala e morre na boca?




Novamente a pista à minha frente. As linhas amarelas cortadas. Eu não sei se você vai conseguir terminar essa trança um dia. Sabe aquela lágrima? Tenho pensando em cortar meu cabelo, mas tenho adiado isso também. É como fumaça de brasa que arde os olhos quando apagamos o que resta do fogo com água repentina. Com os fios longos é mais fácil segurá-los sem que escorreguem, sem que lhes escapem. Não tenho certeza.

domingo, 23 de fevereiro de 2014

Efeito Borboleta

Estou deitada entre lençóis amarrotados que escondem meu corpo nu do leve frio que sinto enquanto você procura a primeira peça, também amarrotada, atirada ao chão. Na madrugada do quarto, o pequeno abajur de estopa mancha de amarelo as paredes e aconchega nossa respiração ainda quente no oxigênio de corpos suados. Como sempre, tenho sono de vestir qualquer coisa e abrir a porta do corredor que não te deixa sair sem que eu destranque o caminho.


Cueca:
Você em pé me observa em silêncio. Um dos raros momentos que nos olhamos sem falar alguma coisa da vida ou da arte.

Jean-s:
Você comenta que tá bonito assim, essa luz no meu rosto com o meu corpo perdido entre as estampas repetidas dos lençóis e dos travesseiros. Eu chorei muito nesses últimos dias. A dor na minha cabeça pesou como se ela estivesse suspensa por um débil filete de nervo no pescoço. Tais mais tantos acontecimentos me fragilizaram nesses últimos dias. Tudo isso me deixou carente e eu ordeno que você me abrace mais uma vez pra, quem sabe, suprir a falta de carinho desses últimos dias. Deitados, conversamos outra coisa legal, mas é você que novamente fala mais enquanto de olhos fechados eu sinto sua pele na minha. Seu peito sem roupa e seus braços um pouco gelados de quem se aquece enquanto gesticula com sérias caretas e algumas risadas empolgadas. O dia quer amanhecer e o mínimo fio de sol nos é proibido.

Camisa:
Você comenta que sabe fazer um ótimo café da manhã e finge que isso não é um convite quando sou direta em perguntar. Eu suspiro cansada da semana, dos dilemas e das cobranças e porque sei que se aproxima o minuto que me separa de continuar pelada para em seguida dormir.

Meias:
Minha vez de procurar as peças perdidas, postas pra lá enquanto você buscava a minha boca e eu a sua.

Calçados:
Meu cabelo embaraçado. Meus seios arrepiados. Meus pés descalços.

Jaqueta:
Você lê um título técnico amontoado entre outros e literaturas na escrivaninha, e eu não queria ter me lembrado de que a segunda-feira não se atrasará em chegar para haver mais tempo de aliviar meu medo.

Seu traje está completo. Com roupa você fica mais sério. Te guio pelo caminho que você já conhece. Você some nas minhas costas e eu nas suas. Todo o trabalho em levantar da cama, me vestir, caminhar até um foco de luz para evitar que você tropece, abrir uma porta, a outra, trancar essa porta, olhar rapidamente para trás, trancar mais esta, tatear no escuro o prego das chaves e voltar para o meu quarto, todo esse trabalho espanta meu sono.
Folheio agora mais um livro sem dedicatória.

sábado, 22 de fevereiro de 2014

Uma e meia

- Tá na fila aí, véi?
- Tô.
.
.
.
- Porra, que demora.
- Ná, o maluco entrô aí faz uma cara. Deve tá cherano.
- Ou tá cherano ou tá cagano.
- Hahaha, pode crê.
.
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- Pô, finalmente.
- E ele dexô uma bera ali. Se o próximo não pegar, ganhei uma cerveja.
.
.
- Pô amigo, agiliza aí que eu tô me mijando.
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- E ganhei uma cerveja!

segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Mastigando nuvens

Não tanto quanto o garoto com armações nos olhos desde os quatro anos. Ontem ele saiu do estágio um pouco depois que os outros, não para trabalhar mais e finalizar antes do previsto o projeto de grande responsabilidade que lhe cabe, mas porque se perdeu no relógio ao admirar a nova fotografia de prédios com céu que a garota, aquela garota dos cabelos coloridos com quem cruza nos corredores da universidade, publicou no Flickr.

A monotonia no rosto da mulher com maquiagem e coque falando ao telefone na janela do prédio mais alto da foto, o lembrou duma cena que ele filmou com os olhos e guardou na memória. Era fim de semana de rua na capital paranaense. Shows espalhados pelas calçadas de petit-pavé e até por praças nunca antes exploradas pelas notas musicais. No palco um clássico da música brasileira com quem ele compartilhava apenas as canções mais famosas. No asfalto seus pés revestidos pelo par azul de tênis velho, cansados das horas acumuladas em pé nos últimos dois dias. Os amigos que o acompanhavam se empolgaram em uma conversa sobre a exposição do eu nas redes sociais pouco depois dele, o meu personagem favorito, se hipnotizar pelo edifício grande de cor triste. Mais especificamente, por uma cortina que escapou da janela durante o fim de semana. Obviamente, algum funcionário ansioso por se divertir na sexta-feira saiu ligeiro após as seis horas, sem perceber que deixou para fora um pedaço da cortina que fica presa ao trilho das piadas repetidas e das planilhas infinitas. Obviamente. Mas prefiro como soa “uma cortina que escapou da janela durante o fim de semana”. O tecido branco de espessura leve ritmava com o vento sua felicidade em quase flutuar acima das árvores. O movimento era sincero e sem pressa, ao contrário do funcionário entregue à rotina. A fluidez da cortina contente desenhava frente às janelas empoeiradas uma coreografia sem repetições que gargalhava aos rodopios e dançava o som das vozes a cantar. Foi o melhor show de artista semidesconhecido bastante reconhecido no Brasil que ele foi.

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Meu olho ardeu por três dias até que uma pequena camada redonda gelatinosa, grande para um olho, nasceu no aparato em forma de oval deitado na parte do meu corpo humano feito próprio para enxergar. Demorei em aceitar que poderia ser algo sério e só então procurei uma oftalmologista.
- Estresse.
- Oi?
- Essa capa-circular-gelatinosa-de-cor-transparente-portanto-sem-cor nascida em seu olho e aí inquilina há uma semana foi ocasionada por estresse.
Obviamente, a oftalmologista se utilizou de termos técnicos os quais não me recordo neste momento. Nem em outro.
- Vou lhe receitar um corticoide. Volte em dez dias para eu analisar a evolução da capa-circular-gelatinosa. Podemos aproveitar e realizar os testes necessários que nos dirão se você precisará utilizar graus em vidro dentro de uma armação a fim de melhor ver e, logo, observar a maneira como o mundo se lhe apresenta.
Voltei.
Meio grau em cada olho.
Coisa pouca, mas tenho que usar óculos, sem os quais as letras embaçadas na tela do computador ou do cinema me agoniam, afinal, agora eu descobri que o mundo é mais nítido e que não existem tantas fumacinhas em volta da lua ou da luz do poste.
Então, eu utilizo óculos com a vantagem de que posso esquecê-los de vez em quando em cima de algum livro que ficou em casa. Até que preciso deles, mas não tanto quando o garoto com armações nos olhos desde os quatro anos.
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Sem as lentes cheias de graus, ele ficaria impossibilitado de ver a foto de prédios com céu que a garota dos cabelos coloridos com quem cruza nos corredores da universidade publicou no Flickr. Ficaria impossibilitado de reparar no contorno das nuvens atrás dos prédios, como ela bem capturou, utilizando a melhor abertura do obturador da câmera e o mais preciso tempo de exposição do filme à entrada de luz que aquela imagem exigia. Ah, quanta beleza e detalhe nessa foto! Sem os graus na frente dos olhos ele não teria reparado nas miudezas daquele clique sensível. Sem os tais, também não teria fôlego para puxar conversa com sua admirada no corredor do dia seguinte. Sem eles, não teria descoberto que as nuvens daquela foto a lembram uma brincadeira de sua infância.

A menina dos cabelos coloridos é filha única de uma família que morava em um condomínio fechado de vizinhos sem filhos. Por muito tempo foi uma criança solitária que encontrava em tudo uma descontração. No fundo de sua casa havia três árvores frutíferas, uma cabana de madeira, um balanço de pneu e um grande pedaço de grama. Em dias ensolarados ela gostava de reparar em como as nuvens são fofas, grandes, brancas, imponentes e saborosas. Nada, nada como mastigar nuvens. Ela sempre levou jeito, como bem diz sua avó, para ser atriz e ela utilizava essa habilidade para imitar os adultos. Acontece que cigarro ela não podia por na boca. E nada tão incorreto e emocionante para uma menina de seis anos como fingir tragar um proibido. Deitada no verde, ela se apoiava em um dos cotovelos e mantinha um pé cruzado sobre o outro. O braço que sobrava era dono da mão a segurar o invisível tabaco entre os dedos. Para ela, cigarros eram as nuvens da terra. De mesma cor, uma a impressionava pela beleza e outro pelo odor amargo. Com pose de personagem principal de filme alternativo (era assim que ela se sentia) a menina mimicava um profundo trago-nicotina com direito a olhos fechados enquanto imaginava, não, enquanto sentia a densa fumaça entrando em seus alvéolos. Fumaça que quando soltava ia voando para o céu e quando muitas fumaças se reuniam no teto azul, as outras crianças, as que não desejavam o cigarro, vislumbravam acima de suas cabeças carneirinhos, pássaros, ursos e dinossauros.

Sem os graus em vidro enjaulados numa armação ele jamais teria sentido o deleite dessa confissão. Ele, o garoto com armações desde os quatro anos. Ele, o estagiário que saiu mais tarde. Ele, o garoto que sonhava com sua admirada de cabelos coloridos. Ele, o menino que viu uma cortina-bailarina. Ele, o meu personagem favorito.



Foto: Bianca dos Santos

sábado, 11 de janeiro de 2014

Quase nua

Foto: Álvaro Sánchez-Montañés

Foto: Álvaro Sánchez-Montañés



Admiro e confesso que tenho um pouco de inveja das pessoas que conseguem falar de si sem preocupações. Acho que a inveja tem em si, mesmo que a gente não queira e geralmente a gente não quer, um pouco de admiração. Afinal, só se inveja algo que se deseja: seja a beleza natural da vizinha que, claro, tem a grama mais verde, seja o charme daquele cara esquisito, a inteligência daquela puta jornalista ou até mesmo as saias da mesma jornalista. E, viu só? Estou refletindo sobre a admiração contida na inveja e não estou falando de mim. Talvez não diretamente.

Quando deixei a auto cobrança, a vergonha, a insegurança e, óbvio, o medo de lado e resolvi criar esse blog pra postar meus contos, mini-contos, cenas que vi-vi, enfim, meus dilúvios literários, coloquei o seguinte texto na descrição: “Eu tô ligada no que está desligado. Me agradam os detalhes. Me apetecem as atitudes singelas. Eu falo muito pouco de mim, porém me exponho: delicadamente na vida, escancaradamente na escrita. Mas não confie em todas”. Posso dizer que quase dois anos (!) depois de formular essas frases ainda sei pouco de mim, muito mais que um dia soube, mas pouco. E nesse momento sempre fico com a dúvida: será que sei tão pouco mesmo sobre mim mesma ou será que é receio em aceitar que eu sou assim, assim, assim?, (como diria a Tulipa). Será que é a auto cobrança e a insegurança outra vez e mais que isso, eu mesma me negligenciando e diminuindo? De novo. De novo?

- E se você pudesse desejar alguma coisa agora? O que seria? Ele me perguntou.
- Eu desejo saber mais sobre mim mesma, me conhecer melhor.
- Sério? Nossa!
- É, por que?
- Porque geralmente as pessoas tendem a achar que se conhecem muito bem.

Há alguns bons anos eu faço terapia ou análise. Aliás, essas terminologias podem causar brigas entre psicólogos. Alguns psicanalistas, e vejam estou dizendo alguns, tendem a achar que terapia é uma coisa fofa com a única serventia de consolar, e que a análise, oh, essa sim, é algo mais profundo em que você pode realmente oferecer ao sujeito possibilidades de raciocinar e entender sua existência. Sabe aquele papo da contaminação dos termos? Pois bem! Tá contaminado, tá tudo contaminado! A minha opção teórica dentro da Psicologia não se utiliza do termo “análise”, geralmente usa-se “terapia” e me irritam os olhos tortos que acham que só a Psicanálise é que se propõe realmente a analisar as escolhas e a subjetividade das pessoas. Existem posturas diferentes porque são profissionais e pessoas diferentes. Obviamente as linhas teóricas influenciam no olhar que se tem para a pessoa sentada (deitada, agitada) à sua frente e ainda bem que influenciam! Mas o fato é que para que a Psicologia possa acontecer enquanto um sincero trabalho há variados fatores importantes de influência, para citar alguns: vínculo, aceitação, empatia (e não simpatia). Os termos teóricos, então, são apenas termos teóricos quando o verdadeiro fazer da Psicologia acontece. E quando isso acontece, ah meus caros, é lindo! E sofrido. Mas é bonito!

Mas então, há uns anos eu faço terapia/análise e nesse espaço que, supostamente, é pra ser apenas meu eu demorei muito pra falar de mim. Muito. E aquele papo de me expor escancaradamente na escrita não é de todo verdade. Inclusive essa afirmação já me ressuscitou alguns ex-amores com a estima alta demais e uns enganos e uma desilusão que não quis causar. Acontece que eu me aproveito, desculpa, de momentos e olhares pra ter o que acho serem umas boas ideias. Tenho contos que começaram a ser escritos numa paixão de verão, mas que só foram encerrados no amor do inverno seguinte. E os amores? Ah, os amores difíceis!

E sabe o que mais é difícil? Minha indecisão e minhas trinta e sete vontades ao mesmo tempo. Há quem diga ser coisa de libriano. É um exercício mental extenuante decidir entre o bombom de maracujá ou de beijinho, entre tomar cerveja de trigo ou avelã. Ah, ok, eu também gosto de dar ênfase no que falo até porque a última dúvida não é tão sofrida e afinal, eu sempre acabo tomando das duas cervejas. Minha ênfase e meu excesso de expressão já assustou algumas pessoas e acabou com relacionamentos. É preciso me conter. E a indecisão, no caso da cerveja, se apresenta apenas em escolher qual será o primeiro sabor e qual vai morrer na boca.

Outra coisa difícil relacionada às minhas vontades e indecisões é o desejo de morar sozinha. Além de me desesperar sem saber quem-vai-matar-a-barata-parada-no-corredor-e-agora-pra-fazer-xixi? eu não sei se suportaria ficar tanto tempo sozinha. Eu morei sozinha por seis meses e foram os piores seis meses de moradia da minha vida. Eu passava os fins de semana sentada numa poltrona grande e nada fazia. O outro me movimenta. Você deve estar se perguntando se... relaxa, eu mato sua curiosidade. Sim, eu já fiquei fins de semanas inteiros sem tomar banho ou escovar os dentes. Apesar de hoje lidar de maneira diferente com a solidão ainda sinto receio em tomar essa decisão. Eu gosto de ter com quem conversar quando chego em casa. Eu gosto de, as vezes, ter gente fazendo barulho na casa. Mas também não gosto de todos os tipos de barulho. Tenha uma conversa interessante e não, por favor, não fale alto. E tenha agradáveis preferências musicais, isso é importante.

Uma coisa eu aprecio muito em estar sozinha: cinema. E veja, não é ir ao cinema ou sair do cinema sozinha, mas assistir um filme sozinha no cinema. De preferência com o cinema vazio sem barulho de pipoca mastigada e latas de refrigerante sendo abertas. Comentários durante o filme só os essenciais e que compõe. A apreciação em ver um filme sozinha no cinema quase se estende para a minha casa ou casa de amigos. Se o filme for bom e rico em detalhes ou se a sonoplastia parecer ausente nos momentos bem pensados de silêncio não fale, não fale não fale não fale. Confesso, quando o filme me toca muito é difícil eu me conter. Não em palavras, mas em respirações e sons estranhos que saem da minha boca em harmonia com a sessão de gestos expressivos que me seguro pra não fazer quando estou acompanhada.

Mas então, eu admiro e confesso que tenho um pouco de inveja das pessoas que conseguem falar de si sem preocupações. Entende porque eu pedi aquele dia pra você começar pelas perguntas concretas? Eu também as acho sem-graça. Sem tempero, sem tropeço, sem tesão. Sem aventura, sem textura, sem emoção. Sem desafio, sem desvio, sem extravio. Sem simpatia, sem alergia, sem agonia. Sem sinceridade, sem instabilidade, sem ambuiguidade. Sem sedução, sem complicação, sem elucubração. Sem dúvida, sem amor, sem rubor.

quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

O bicho que Deus é

- Olha que linda essa mesquita!
- Sim, é linda! Cheia de cores e com essa luz bonita.
- Será que dá pra entrar?
- Até dá, mas não agora que é noite e tá fechada.
- Mas deveria estar aberto porque Deus não dorme. As pessoas podem rezar a hora que quiserem.
Gargalhadas da terceira pessoa que caminhava conosco.
- Mas Deus deve dormir porque ele descansou no último dia.
- Mas todo mundo vai à missa aos Domingos.
- Só que o último dia é Sábado, baby!
- Ah, sim. É minha religiosidade falando. De qualquer forma, acho que Deus dorme de olho aberto. Há muitas pessoas nessa humanidade pra ele ouvir, ajudar, se irritar...
- É, Deus deve dormir de olho aberto.
- Se Deus dorme de olho aberto, Deus dorme de olho aberto! Logo, ele é um peixe.

Fim.