sábado, 27 de outubro de 2012

Três da Tarde

Quando a noite chega ainda na hora do dia e ninguém mais quer trabalhar ou estudar o céu de triste azul-claro-bobo foi ficando cinza escuro e o fôlego que sobrava em quem caminhava até o banco, em quem explicava equação fatorial, o fôlego de quem não finalizava o relatório, de quem acelerava na rodovia desacelerou. O fôlego suspirou e não quis mais ofegar.

Quando a noite chega na hora do dia e ninguém mais quer trabalhar ou estudar a maioria trabalha e estuda. Mas aquela semana estava comprida e resolveu que não iria terminar. Meses sem sextas. Sem sextas-noites e sem cestas-arremessos porque o pai do filho pequeno só pulava alto aos sábados. Meses morrendo em meio às obrigações riscadas no papel. Meses amassando intermináveis massas de modelar. Meses programando códigos suspensos de eletricidades virtuais. 

Mas aquela semana estava comprida e resolveu que não queria terminar. E o céu que ficou cinza-escuro empalideceu a cidade pra combinar com os rostos murchos. Nuvens escuras começaram a dançar num ritmo fluido que densou a água acumulada. Os algodões agora nada brancos sobre as nossas mornas-vidas intensificaram o ritmo do compasso até que o líquido transparente saísse silencioso do montante de veludo flutuante. Os outros mais os que franziam as testas de cansaços, mais os que espirravam, mais os que verticalizavam cimentos e mais os que contavam moedas... ao sentirem o cheiro inconfundível se aproximar pararam. Até que as gotas tocassem o piso, o teto, a árvore, a casa e a cara não houve barulho ou ruído. O trânsito se acalmou, o carro apagou, a palestra cessou. 

Diagonal e fino o choro da cidade beijou todos os lábios que se abriram para sorrir ou chorar. Aliviou o fluxo de sangue que corria nas veias para aí sim pipocar com força tranquilizante todas as superfícies e todos os que queriam ser tocados. 

E o que se viu enquanto as grossas gotas gotejavam foi cama dormindo com homem de terno e gravata, foi a receita mais demorada sendo elaborada, foi cheiro de café, filme na sala, bolinho de chamego. Foi menina que até parou de escrever para

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